Dialética do Esclarecimento -
Adorno e Horkheimer O Conceito de Esclarecimento
O esclarecimento tem a
função de livrar os homens do medo e de colocá-los como senhores de si
próprios.
O esclarecimento humano
seria o grande tesouro do mundo, sua meta era dissolver os mitos e substituir a
imaginação pelo saber.
Não é bom se dizer que temos
duvidas, ou que não temos certezas. O entendimento é um bem do humano, porém as
vezes caímos sobre o entendimento sem saber para onde iremos.
O saber é poder, pois
esclarece o entendimento humano e o faz livre.
Xenófanes zombava da
multidão de deuses, porque eram iguais aos homens, que os produziram, em tudo
aquilo que é contingente e mau, e a lógica mais recente denuncia as palavras
cunhadas pela linguagem como moedas falsas, que será melhor substituir por
fichas neutras. O mundo torna-se o caos, e a síntese, a salvação.
No trajeto para a ciência
moderna, os homens renunciaram ao sentido e substituíram o conceito pela
fórmula, a causa pela regra e pela probabilidade.
Para os pré- históricos a
vida e a morte haviam se explicado e entrelaçado nos mitos.
O esclarecimento, porém,
reconheceu as antigas potências no legado platónico e aristotélico da
metafísica e instaurou um processo contra a pretensão de verdade dos
universais, acusando-a de superstição.
Para Platão o elemento
básico do mito sempre foi o antropomorfismo, a projeção do subjetivo na
natureza. Os demônios seriam as imagens dos homens que se deixam amedrontar
pelo natural. Todas essas figuras míticas podem se reduzir, pelo
esclarecimento, ao homem.
os mitos que caem vítimas do
esclarecimento já eram o produto do próprio esclarecimento. No cálculo
científico dos acontecimentos anula-se a conta que outrora o pensamento dera,
nos mitos, dos acontecimentos. O mito queria relatar, denominar, dizer a
origem, mas também expor, fixar, explicar.
O esclarecimento acabou por
consumir não apenas os símbolos mas também seus sucessores, os conceitos
universais, e da metafísica não deixou nada senão o medo abstrato frente à
coletividade da qual surgira.
Pois o esclarecimento é
totalitário como qualquer outro sistema. Sua inverdade não está naquilo que
seus inimigos românticos sempre lhe censuraram: o método analítico, o retorno
aos elementos, a decomposição pela reflexão.
Kant combinou a doutrina da incessante e
laboriosa progressão do pensamento ao infinito com a insistência em sua
insuficiência e eterna limitação. Sua lição é um oráculo. Não há nenhum ser no
mundo que a ciência não possa penetrar, mas o que pode ser penetrado pela
ciência não é o ser.
A
Indústria Cultural: O Esclarecimento Como Mistificação das Massas
A unidade evidente do
macrocosmo e do microcosmo demonstra para os homens o modelo de sua cultura: a
falsa identidade do universal e do particular. Sob o poder do monopólio, toda
cultura de massas é idêntica, e seu esqueleto, a ossatura conceitual fabricada
por aquele, começa a se delinear. Os dirigentes não estão mais sequer muito
interessados em encobri-lo, seu poder se fortalece quanto mais brutalmente ele
se confessa de público.
A televisão visa uma síntese
do rádio e do cinema, que é retardada enquanto os interessados não se põem de
acordo. As queixas dos historiadores da arte e dos defensores da cultura acerca
da extinção da força criadora do estilo no Ocidente são assustadoramente
destituídas de fundamento. A tradução estereotipada de tudo, até mesmo do que
ainda não foi pensado, no esquema da reprodutibilidade mecânica supera em rigor
e valor todo verdadeiro estilo, cujo conceito serve aos amigos da cultura para
transfigurar em algo de orgânico o passado pré-capitalista.
Se ele adapta Mozart ao
jazz, ele não o modifica apenas nas passagens em que Mozart seria difícil ou
sério demais, mas também nas passagens em que este se limitava a harmonizar de
uma maneira diferente, ou até mesmo de uma maneira mais simples do que é
costume hoje. Nenhum construtor medieval poderia ter passado em revista os
temas dos vitrais e esculturas com maior desconfiança do que a hierarquia dos
estúdios de cinema ao examinar um tema de Balzac ou Victor Rugo, antes de lhe
dar o imprimatur do aceitável.
É com razão que o interesse
de inúmeros consumidores se prende à técnica, não aos conteúdos teimosamente
repetidos, ocos e já em parte abandonados. Todavia, a indústria cultural
permanece a indústria da diversão. Seu controle sobre os consumidores é mediado
pela diversão, e não é por um mero decreto que esta acaba por se destruir, mas
pela hostilidade inerente ao princípio da diversão por tudo aquilo que seja
mais do que ela própria.
— A diversão é o
prolongamento do trabalho sob o capitalismo tardio. Ela é procurada por quem
quer escapar ao processo de trabalho mecanizado, para se pôr de novo em
condições de enfrentá-lo. . Mas, ao mesmo tempo, a mecanização atingiu um tal
poderio sobre: a pessoa em seu lazer e sobre a sua felicidade, ela determina tão
profundamente a fabricação das mercadorias destinadas à diversão, que esta
pessoa não pode mais perceber outra coisa senão as cópias que reproduzem o
próprio processo de trabalho.
A fusão actual da cultura e
do entretenimento não se realiza apenas como depravação da cultura, mas
igualmente como espiritualização forçada da diversão. Divertir significa
sempre: não ter que pensar nisso, esquecer o sofrimento até mesmo onde ele é
mostrado. A impotência é a sua própria base. É na verdade uma fuga, mas não, como
afirma, uma fuga da realidade ruim, mas da última ideia de resistência que essa
realidade ainda deixa subsistir. A liberação prometida pela diversão é a
liberação do pensamento como negação.
No liberalismo, o pobre era
tido como preguiçoso, hoje ele é automaticamente suspeito. O trágico é reduzido
à ameaça da destruição de quem não coopera, ao passo que seu sentido paradoxal
consistia outrora numa resistência desesperada à ameaça mítica. O destino
trágico converte-se na punição justa, na qual a estética burguesa sempre
aspirou transformá-la. A moral da cultura de massas é a moral degradada dos
livros infantis de ontem.
Na indústria, o indivíduo é
ilusório não apenas por causa da padronização do modo de produção. Ele só é
tolerado na medida em que sua identidade incondicional com o universal está
fora de questão.
O novo não é o carácter
mercantil da obra de arte, mas o facto de que, hoje, ele se declara
deliberadamente como tal, e é o facto de que a arte renega sua própria
autonomia, incluindo-se orgulhosamente entre os bens de consumo, que lhe
confere o encanto da novidade. A arte como um domínio separado só foi possível,
em todos os tempos, como arte burguesa.
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